segunda-feira, março 27, 2006

Burocracia propositada

De Fátima Mata-Mouros (Juíza de Direito), em “A propósito da “nova” responsabilidade do Estado pelos erros da Justiça” (publicado no Público a 26 de Março) retiro o seguinte:

“E o que a nova lei discutida no Parlamento anuncia como uma “opção arrojada” não passa, afinal, de mera proclamação de estender à Justiça o regime da responsabilidade da administração: um rosário de petições, acções e recursos que esperam pelo cidadão lesado nos tribunais para conseguir ver o seu direito reconhecido, se é que alguma vez o conseguirá. Claro que, no final de toda aquela penitência pelos tribunais, a culpa pelo pagamento das indemnizações será mais uma vez da justiça – isto é, dos juízes. Não que o Estado não quisesse pagar!

Com tantos modelos de leis para a Justiça que temos importado do estrangeiro, quando deixaremos de seleccionar apenas aquelas que não implicam despesa electiva e imediata para aprovar as medidas que de facto realizam a garantia fundamental dos cidadãos a uma decisão judicial pronta e efectiva para os seus direitos e pretensões?”

Ao longo do artigo a Juíza dá o exemplo da Alemanha, na qual todas as decisões dos tribunais incluem automaticamente o pronunciamento sobre as eventuais indemnizações do estado aos cidadãos (mesmo aos condenados) sem que estes tenham de fazer recurso a processo especifico de indemnização (e que implica novo julgamento).

Bem …, a pouco e pouco estou a conhecer este País (que ainda por cima se diz democrático); a própria lei é estruturada segundo processos que visam a sua não aplicação, como diz Mata-Mouros.

Este País não é só burocrático devido a uma legislação ou a uma ultra regulamentação incompetente; produziu-se e produz-se má legislação e regulamentos porque não se pretende que elas sejam cumpridas.

Do Canadá

E…, e embaixador do Canadá responde ao alarme de quem se acha “democrático” quando não se observa a Lei!

“Acolhemos com entusiasmo e reconhecimento os imigrantes que satisfaçam os requisitos da Lei Canadiana sobre Imigração; e a maioria deles adquirem a nacionalidade canadiana após três anos. Este é o caso de meio milhão de canadianos de origem portuguesa que, no decorrer dos anos, contribuíram, juntamente com todos os outros canadianos para a edificação de uma democracia moderna baseada na lei e no cumprimento da mesma.” (retirado do Público de 26 de Março).

Foi simpático o embaixador do Canadá: admite que possa haver democracias modernas que não se baseiam na Lei ou no cumprimento dela – isso sempre nos dá azo a admitirmos que vivemos numa democracia (numa democracia à Lula da Silva: “cada um escolhe a democracia que quer”).

sábado, março 25, 2006

Vontade de mudar! … Aonde?

Há dias, o Governo divulgava que os Governos Civis (18) iam acabar.

Penso que uma tal decisão não terá surpreendido ninguém, a não ser (eventualmente) o poder ter induzido a ideia que finalmente “isto” pode estar a começar a mudar; acabar com algo que não serve para nada (a não ser dar uns “tachos” à custa dos contribuintes líquidos) não constitui admiração ou surpresa.

Mas foi “Sol de pouca dura”; dias depois, o Ministro da área vem dizer que isso só ocorrerá com a “Regionalização” (na próxima legislatura), cuja implementação estará em curso.

Agora sim … surpresa!

O País, os cidadãos portugueses, em consulta directa, reprovaram a Regionalização.

Como é possível que um Governo inicie um processo de implementação de uma coisa que foi reprovada pelos cidadãos em consulta directa?

Bem …, há muito que tenho manifestado nestas páginas que Portugal tem um conceito de democracia muito próprio, diria uma “democracia à portuguesa” (democracia por baptismo; não, de conteúdo); este desprezo com que o Estado Português encara a vontade dos cidadãos portugueses (nas poucos vezes em que se lhes pede que exerçam o seu direito à cidadania) só o vem confirmar.

Vontade de mudança? Afinal …, não há (o que não é surpresa).

E nunca haverá enquanto os cidadãos portugueses lhes pagarem as contas!

quinta-feira, março 23, 2006

Nem queria acreditar …

No Público de 22 de Março, Ricardo Dias Felner assina um artigo intitulado “O principio do fim de uma país exemplar?”

O autor insurge-se contra o Canadá porque passou a ser mais exigente na aplicação da sua legislação e, como, tal está a expulsar os imigrantes que entram ilegalmente no País (inclusive, evidentemente, os imigrantes ilegais portugueses).

Isso vem confirmar o como uma cultura pró criminosa, pró anti-lei, se assenhoreou do pensamento português (como afirmo em demagocracia.blogspot.com); até o comportamento ilegal passou a ser publicamente defendido.

Como é possível vir para um Jornal pugnar para que um País não cumpra preceitos legais básicos como o de exigir que quem quer que seja que entre nas suas fronteiras e permaneça nesse País o faça de forma legal?

E mais … “que é o princípio do fim de um País exemplar”!

“Exemplar” ..., quando não se cumpre a Lei?

Se estes são os nossos intelectuais e os que “fazem a opinião” está bem justificado o lamaçal legal em que vivemos – isto não vai poder mudar, já se entranhou nos nossos poros (José Gil tem razão).

Estamos bem arranjados!

quarta-feira, março 22, 2006

O “primarismo” tomou conta da esquerda

Na França, a esquerda promove a constatação ao projecto de lei da flexibilização do emprego até aos 26 anos.

Uma das características que marcam a diferença entre o pensamento humano e dos nossos primos mais próximos, os símios, é o nível de intencionalidade que o pensamento humano pode alcançar.

Estudos têm mostrado que esse nível de intencionalidade varia de pessoa para pessoa, mas em geral cerca de 95% dos seres humanos consegue chegar ao nível de intencionalidade cinco:

Pedro acredita [1] que Joana pensa [2] que Júlia quer [3] que Pedro suponha [4] que Joana pretende [5] que Júlia acredite [6] que a bola está debaixo da almofada.

Quando se pretende que o empregador seja obrigado a preservar o emprego a alguém com o objectivo de evitar o respectivo desemprego está-se a raciocinar com um nível de intencionalidade dois (raciocínio absolutamente primário).

É evidente que o empregador passará a restringir as suas admissões ao máximo pois sabe bem que os riscos do mercado nunca lhe garantirão uma capacidade de empregabilidade constante e não pode correr o risco de ter empregados excedentes.

Também não pode admitir quem não tenha já provas dadas; é um risco elevado admitir um jovem, por exemplo, acabado de sair dos estudos pois não tem garantias sobre o seu desempenho humano e profissional.

Mesmo em situações de pressão de mercado durante a qual lhe faria jeito aumentar o número de empregados não o poderá fazer porque isso implicaria uma responsabilidade que depois teria de suportar quando o mercado já não o justificasse.

E, finalmente, sempre que possível procurará resolver os problemas de emprego introduzindo mais máquinas em vez de empregados ou deslocalizando as suas actividades para locais de empregabilidade mais flexível, mesmo que tenha de pagar até salários mais elevados.

Chegando ao nível de intencionalidade três (os estudos mostram que os símios não chegam a esse nível de intencionalidade) facilmente se conclui que a preservação ou criação de empregos fica bloqueada ou diminui apesar de uma legislação cujo objectivo seria evitar o aumento do número de desempregados.

Também bastaria comparar com o que ocorre em países aonde não há esse tipo de legislação; mas nem isso fazem.

Mas podíamos ir mais longe na intencionalidade dos interventores. Admita-se …

terça-feira, março 21, 2006

É a diferença …

A Ministra dos Negócios Estrangeiros da Suécia acaba de ser obrigada a pedir a demissão por ter participado na tentativa de impedir um blog (inclusive de extrema direita) de publicar caricaturas de Maomé e de ter mentido sobre o seu envolvimento em tal acto.

Pois é …, esta é um a grande diferença entre a capacidade de exercício da cidadania naquele País e em Portugal; é isso que não conseguimos aprender apesar das muitas visitas que se façam aos países mais desenvolvidos. Só vemos neles o que convém a “alguns”, nomeadamente o que permitirá aumentar ainda mais a intervenção do Estado sobre a sociedade civil portuguesa e o bloqueio à nossa cidadania.

segunda-feira, março 20, 2006

Agricultura portuguesa

Com dados até 2002, um recente (!) estudo da Universidade de Évora, que confirma o que sempre se soube, tornou a chamar a atenção para a Agricultura portuguesa e para a situação miserável em que há muitíssimo tempo se encontra.

Uma vez um Embaixador Português disse-me: “Angola, não é um País conseguido”; hoje, ter-lhe-ia respondido: “E Portugal é uma País des-conseguido”.

A Agricultura Portuguesa é um bom exemplo do que não deveria ter sido feito; mas não só se fez como continua a ser feito. E tudo isso sob a batuta de um Ministério (com milhares de funcionários) que ninguém sabe para que serve (perguntem aos agricultores?).

Há uns quatro ou cinco anos, num debate da TSF, alguém propôs que o Ministério da Agricultura lançasse programas de extensão rural em Portugal. Logo apareceu um Sr. do Ministério indignado: que isso eram soluções à terceiro mundo.

De facto, António Guterres cometeu muitíssimos erros; um deles foi dizer que Portugal não era um País das bananas – enquanto não estivermos convictos que é de facto um País das bananas (apenas “lustroso”, porque integrado na Europa e com o dinheiro da União) não se tomarão medidas suficientemente sérias e “com os pés no chão”.

Sendo toda a sociedade portuguesa, nomeadamente a Agricultura, marcada pela forte intervenção do Estado Português em todos os seus aspectos (aí de quem não faça o que o Estado quer e não seja protegido e financiado por ele) é bom de saber aonde está o culpado …

sexta-feira, março 17, 2006

Recordando Medina Carreira (I)

Extraído do artigo publicado no DN a 1 de Fevereiro de 2005

1. Teremos em breve eleições legislativas. As terceiras desde 1999. E é improvável que, em Fevereiro de 2005, se encontre uma solução política adequada para enfrentar a nossa gravíssima crise. O Estado é inoperante, insustentavelmente sobredimensionado, está em crescente desqualificação e perdeu poderes decisivos de intervenção económica (monetário, cambial, alfandegário e orçamental). A economia fragilizou-se no último quarto de século, só reagindo, ocasionalmente, com o impulso de ocorrências externas, muito favoráveis. O peso da despesa pública levará, em poucos anos, ao colapso financeiro do Estado, com pesadas consequências para todos mas, em especial, para mais de 4,5 milhões de indivíduos dele directamente dependentes (1). Ninguém, revelou, na política activa actual, discernimento, aptidão e credibilidade para tranquilizar o País e vencer uma tal crise. Com o "anonimato" dos candidatos a deputados, generalizou-se a promoção do demérito; os principais partidos políticos são hoje a melhor e a mais procurada agência de empregos para uma certa "mão-de-obra"; a ilimitação dos mandatos favorece a inércia e a rotina; o exclusivo partidário da apresentação de candidaturas visa a obediência e a hipocrisia política (2); a opacidade do financiamento dos partidos estimula a corrupção. O sistema semi-presidencial que vigora mostra-se inconsequente: o Presidente da República medita, reúne, exorta, insiste e é muito aplaudido, mas nada acontece. Os governos são escolhidos a partir de programas eleitorais irrealistas e demagógicos; enfraquecidos pelo inevitável incumprimento das promessas, são diariamente fustigados, julgados e condenados no primeiro acto eleitoral que aconteça. O Parlamento, com gente a mais e que nada representa, é palavroso e inconsistente, e vai degradando a imagem da democracia. Os problemas do País acumulam-se e agravam-se, e o tempo útil das soluções está a esgotar-se. Nos anos 20 e 30 do século passado, na Europa, este tipo de democracia atraía os ditadores. No início do século XXI, mantém o atraso e conduz à pobreza.

(1). Cerca de 730 000 funcionários públicos; 2 591 000 pensionistas da Segurança Social; 477 000 reformados e pensionistas da Caixa Geral de Aposentações; 307 000 beneficiários do subsídio de desemprego; 351 000 beneficiários do RMI. Com os familiares próximos poderão ser uns 6 milhões de indivíduos, numa população de 10 milhões.

(2). "Os bons não querem ir para lá, e os maus querem porque aquilo é um emprego fácil". "As direcções partidárias gostam de deputados amigos ou gente que não chateie" (Vicente Jorge Silva, Grande Reportagem, 22.01.05). Já pressentíamos o que agora é confirmado por quem saiu há semanas da Assembleia.

terça-feira, março 14, 2006

O ERRO de Carvalho da Silva

Hoje, ouvi Carvalho da Silva na TSF; ele dizia (as palavras são minhas) que não concordava que se criticasse o Estado por já receber muitos impostos, tendo em atenção os elevados lucros da Banca e que estes não podem, por si, ser considerados um “bem nacional” pois constituem património privado.

De facto é um raciocínio bem dentro da lógica comunista; a riqueza da Nação não é a riqueza dos cidadãos, é a riqueza do Estado – o que interessa não são cidadãos ricos mas, sim, o Estado rico.

Na verdade, a URSS e os países comunistas do leste europeu não lhe serviram de exemplo para nada; aí o Estado era quem mais mandava (não era só o mais rico, ele detinha toda a riqueza nacional, inclusive detinha a mão de obra de todos os “súbditos”, a titulo quase gratuito) e o resultado está à vista de todos.

O Estado Português tem-se “fartado” de mostrar contínua incompetência na gestão dos recursos do País, mas Carvalho da Silva ainda quer que os cidadãos portugueses lhe entreguem mais dinheiro!

Carvalho da Silva ainda não entendeu que, como na URSS e nos países do leste europeu e, também, como em todos os países centralizados em Estados fortes e com escassa cidadania, entregar mais dinheiro ao Estado é depredar, de forma crescente, a riqueza nacional.

Com raras excepções, o excesso de intervencionismo estatal e o bloqueio da cidadania só resultam em depredação da riqueza nacional, proteccionismo às elites políticas e económicas, aumento da desigualdade social e empobrecimento global da Nação.

Eu não creio, sinceramente, que Carvalho da Silva defenda isso para Portugal; mas a sua “solução” conduziria a uma situação bem pior da que já existe hoje.

Claro que Carvalho da Silva tem razão quando diz que os lucros da Banca saíram do bolso dos cidadãos portugueses; é verdade – e, é verdade, porque alguém (os cidadãos) andou a pagar mais impostos para que a Banca pagasse menos impostos.

O que está incorrecto em Portugal e na política do Estado Português é que não existe igualdade perante a Lei e não existe mercado; assim o quanto foi bom para a Banca (e para os investimentos estrangeiros) pagar menos impostos teria sido igualmente bom para os restantes sectores económicos do País e para os cidadãos portugueses.

Carvalho da Silva tem razão quando diz que uns andam a viver à custa dos outros; mas quem proporciona isso? – É o Estado; sempre o foi, aqui em Portugal, e em todo o lado.

Por isso, o povo inglês, no século XVI, retirou ao Rei a capacidade de lançar impostos e instaurou a democracia; a mais antiga do planeta.

Nos países anglo-saxónicos, e aonde o Estado é controlado a sério pelos respectivos cidadãos (o que não se passa em Portugal), não se pode mexer nos impostos de “ânimo leve”; e, não se pode, porque impostos são o “suor” de quem trabalha.

Portugal estaria muitíssimo melhor hoje se o dinheiro ficasse muitíssimo mais com quem o produz (finalmente, seria possível enriquecer, em Portugal, através do trabalho) e se uns tantos não vivessem à custa do trabalho dos outros (o que acontece sempre através do Estado; através dos privilégios que cria para proteger uns – os beneficiários líquidos - em detrimento de outros – os contribuintes líquidos).

Por exemplo, a arquitectura urbana existente em Portugal não é o resultado dos mestres-de-obras (dos “patos bravos”), como muitos dizem; quem aprovou e impôs essa arquitectura foi o Estado, foram os autarcas – esses, sim, são os culpados (os corruptores activos) e não os “patos bravos” que, para poderem trabalhar, foram “obrigados” a pagar aos autarcas e a fazer as monstruosidades urbanas que financiaram aqueles pagamentos.

Não se trata pois de dar mais dinheiro ao Estado como sugere Carvalho da Silva; é precisamente ao contrário. É preciso deixar a riqueza com quem a cria para que a possa reaplicar e criar mais riqueza e mais emprego e é preciso acabar imediatamente com quem vive à custa da exploração que o Estado faz dos cidadãos, nomeadamente dos que vivem abrigados na discriminação política e económica que o Estado lhes oferece.

sábado, março 11, 2006

Cavaco esqueceu-se!

Cavaco acaba de tomar posse como Presidente da República.

Não tenho dúvidas que foi o melhor Primeiro-Ministro de Portugal nos últimos 50 anos. Também não duvido que tudo fará para ajudar Portugal enquanto for Presidente da República; não duvido que não se limitará a “passear” e a “cortar fitas” enquanto o País caminha a passos largos para o precipício.

Contudo, Cavaco também co-participou na Crise em que vivemos; tem muita razão quando afirma que tinha de por a “casa” em ordem e que a culpa da actual Crise esteve no Governo que se seguiu (o de António Guterres).

Tem “muita razão”, mas não tem “toda a razão"; e não a tem porque Cavaco “olhou” essencialmente para a melhoria da eficiência do fortalecimento do papel do Estado na sociedade portuguesa e esqueceu-se do papel da cidadania – ora, a causa da actual situação do País é precisamente essa: o forte papel interventor do Estado na sociedade portuguesa e o correspondente esmagamento da capacidade de exercício da cidadania por parte dos cidadãos portugueses.

Cavaco deu o mote (que já o precedia); sob pressão da nossa cultura (da nossa praxis social), António Guterres seguiu em frente desabrido – em quanto terão aumentado os impostos nos últimos 15 anos? Quantos milhares de milhões de euros, dos nossos impostos, foram depredados em pseudo investimentos, em investimentos não rentáveis e em investimentos de rentabilidade duvidosa e a longuíssimo prazo? Quantos empregos fictícios foram criados? Quanta burocracia foi acrescentada à anterior (para bloquear ainda mais a iniciativa dos cidadãos)? Quanta displicência, oportunismo, deixa andar e falta de sentido de responsabilidade foi injectada nos serviços de saúde, de educação, judicial, administração, etc?

E foi isso que Cavaco se esqueceu, ao definir (num brilhante discurso) as grandes linhas (desafios) que nortearão a suas preocupações durante a sua Presidência.

Cavaco esqueceu-se de colocar entre as suas mediadas de intervenção, enquanto Presidente da República, a que eu considero que deveria ser a “primeira”, a fulcral à democracia portuguesa e ao desenvolvimento, a imprescindível como resposta à presente Crise: ou seja, a urgentíssima preocupação e necessidade em se promover a capacidade dos portugueses exercerem a CIDADANIA.

Pareceria do mais elementar: “deixar os cidadãos portugueses poderem agir”; mas não é – os políticos portugueses e o Estado não acreditam na cidadania, não acreditam na sociedade civil portuguesa. Portugal não é a Nação, é o Estado – por isso não somos de facto uma democracia(segunda a concepção anglo-saxónica; aí, aonde ela teve a sua origem).

A resolução da nossa Crise não passa só por dizer “deixem-me trabalhar”; passa, essencialmente, por dizer “deixem os portugueses trabalhar”.

Talvez tenha sido só esquecimento de Cavaco; talvez esteja também entre as suas preocupações a cidadania, embora não fizesse parte dos desafios que enunciou – esperemos que sim. Pelo menos, a integração de J.C. Espada no seu gabinete é a esperança de que um novo olhar sobre a Cidadania pode ter lugar, finalmente, em Portugal.

quinta-feira, março 09, 2006

Cinco em Um / Vai-nos ficar caro!

Portugal já aprovou o Cartão que integrará cinco cartões em um; a experiência será, brevemente, lançada nos Açores.

O Governo promete que o cartão não será utilizado para cruzar informações – alguém acredita?

Pior ainda: porque se dá ao trabalho de “mentir” aos portugueses? Ou será que, este Governo, é tão inocente que acredita mesmo no que diz?

Precisamente na altura em que este cartão é aprovado em Portugal (num País de “democracia à terceiro mundo”), discute-se a introdução, na Grã-Bretanha, de um Bilhete de Identidade cuja emissão só se fará para os cidadãos que o queiram (e isso na democracia mais antiga do Planeta).

Como disse: “discute-se” (e por causa do terrorismo), mas não foi aprovado porque se considera que a existência de um Bilhete de Identidade pode significar restrições à liberdade dos cidadãos ingleses face ao poder do Estado – e, reparem, isso acontece num País em que o Estado há muito que é fortemente controlado pelos cidadãos (o que está longe de acontecer em Portugal).

Em nenhum País anglo-saxónico há Bilhete de Identidade; será por isso que nunca houve em nenhum desses países revoluções populares (com excepção da guerra contra a escravatura nos EUA) e que nunca tiveram sistemas ditatoriais?

As únicas revoluções foram as que instalaram a democracia na Inglaterra ou as realizadas contra as tentativas régias de a perverter.

Em oposição, a Europa Continental, que tem Bilhetes de Identidade há centenas de anos, tem uma história recheada de revoluções populares e de ditaduras dos mais variados tipos.

Em Portugal, o "Cinco em Um" foi aprovado; sinal dos tempos?

terça-feira, março 07, 2006

Sócrates e a Finlândia

Sócrates visita a Finlândia para “aprender” do seu sucesso.

O problema de Portugal nunca foi a falta de visitas de “aprendizagem”; grande parte dos Primeiros-Ministros de Portugal são muito viajados e, muitos deles, tiraram mestrados e doutoramentos em Universidades estrangeira, inclusive na Grã-Bretanha e nos EUA.

O problema é o olhar com que os nossos Primeiros-Ministros vêem a experiência dos outros.

Geert Hofstede afirma (em Culturas e Organizações): A cultura “influencia não só a nossa vida quotidiana – a forma como vivemos, crescemos, gerimos e somos geridos e até a forma como morremos – mas também as teorias que somos capazes de desenvolver para explicar as nossa práticas. Nada na nossa vida escapa à influência da cultura.”

Ou seja, não é pelo facto de muito visitarmos e até estudarmos em Universidades estrangeiras que nos leva a olhar os “outros” sobre o ponto de vista das suas próprias culturas; “olhamos” sob o ponto de vista da cultura portuguesa e “ajeitamos” o que vemos à nossa interpretação cultural.

Ora, a cultura político-administrativa do Estado Português é de intervencionismo intenso sobre a sociedade portuguesa e de bloqueio ao exercício da cidadania.

O que Sócrates vai, pois, ver na Finlândia?

Vai ver, evidentemente, como o Estado Português ainda pode intervir mais na sociedade portuguesa; ou seja, vai arranjar ainda mais motivos para intervir, ainda mais, na sociedade portuguesa.

Não lhe passará pela cabeça ir ver na Finlândia, o papel da cidadania e da sociedade civil no sucesso da Finlândia: o tipo de controlo que a sociedade civil exerce sobre o seu Estado e sobre os políticos (por isso a corrupção é tão baixa), a politica de liberalização, desregulamentação e privatização (sem goldenshare’s) aí amplamente implementada e de um mercado de trabalho com grande flexibilidade.

Não lhe passará pela cabeça ir-se informar sobre a eficiência do seu sistema judicial, da administra pública (das menos pesadas da Europa), das baixas “mordomias” das elites públicas, etc.

Nem lhe passará pela cabeça aprender sobre o uso correcto do dinheiro dos impostos, nem de como se não deve subsidiar e proteger corporações incompetentes, nem mesmo que somando-se todos os impostos praticados em Portugal (IVA, IRS, combustíveis, álcool, autárquicos, etc.) eles ainda são maiores que os da Finlândia.

Nem mesmo, será capaz de olhar o aeroporto aonde desembarcou (simplório e provinciano quando comparado com o da Portela) e a inexistência de auto estradas e...

Bem …, ele não tem culpa (como diz Geert Hofstede); trata-se de uma cultura diferente!

Ou seja, Sócrates, como outros antes dele, irá ver o que lhe interessa e melhor se adapte à tradição intervencionista do Estado português e ao esmagamento da cidadania em Portugal.

Não vamos lá, por muitas visitas que façamos …

quarta-feira, março 01, 2006

A ARCO e os subsídios do Estado à cultura

Decorre em Madrid uma das feiras de arte mais prestigiadas do Mundo; este ano, cerca de 200 expositores, de quase todo o mundo, estão presentes na feira.

Das entrevistas que foram feitas, por uma televisão portuguesa, a alguns expositores nacionais presentes na ARCO, saliento: temos melhores artistas que Espanha, mas não temos o mesmo apoio do Estado.

A minha memória recuou 25 anos atrás; a uma conversa que tive com do Embaixador de Espanha em Angola (realizada ao longo de uma viagem aérea de cerca de duas horas).

Um dos temas da conversa foi a cultura espanhola, nomeadamente a cinematográfica. Nunca mais me esqueci do que na altura me disse o Embaixador Espanhol:

Enquanto o Estado Espanhol subsidiou o cinema, ganhávamos prémios por todo o mundo, mas o povo espanhol não via os filmes espanhóis; quando o Estado Espanhol deixou de subsidiar o cinema nacional, deixámos de ganhar prémios, mas o povo espanhol começou a ver os filmes espanhóis”.

E é assim!

O que terá levado aquela senhora, uma das entrevistadas, a dizer que Portugal tinha melhores artistas que Espanha?

No mínimo, essa afirmação é de uma total falta de modéstia (ou “dor de cotovelo” - a lembrar José Gil); mas, com que base afirma ela tal coisa? No número de prémios (e que tipo de prémios?); os tais, que são ganhos mas ninguém “compra”?

Bem …, e quanto à ajuda do Estado?

É precisamente ao contrário do que afirmaram alguns entrevistados; é precisamente porque o Estado Espanhol deixou de distribuir subsídios (a “paixão” dos Estados Corporativos, embora lhes chamem, hoje, Estados-Providência) que a cultura espanhola ganhou nova pujança e ganhou não só o povo espanhol como admiradores por esse mundo fora.

A solução da cultura portuguesa não é dar mais subsídios; a solução é diminuir ou acabar com os subsídios – quem tem que definir quem é “bom” ou “mau” não pode ser uma “nomenclatura” do Estado (nomeada para o efeito) ou um “Sindicato de Pares”; quem tem que o fazer são os cidadãos.

O Estado Português não tem de intervir ainda mais na produção cultural; pelo contrário, tem que a diminuir ou acabar com essa intervenção – e, evidentemente, diminuir os impostos; os cidadãos portugueses não têm poder de compra para serem capazes de incentivar qualquer produção cultural porque constituem uma população empobrecida pelo Estado Português (por força dos, absurdamente, elevados impostos, que têm de pagar).