sábado, março 11, 2006

Cavaco esqueceu-se!

Cavaco acaba de tomar posse como Presidente da República.

Não tenho dúvidas que foi o melhor Primeiro-Ministro de Portugal nos últimos 50 anos. Também não duvido que tudo fará para ajudar Portugal enquanto for Presidente da República; não duvido que não se limitará a “passear” e a “cortar fitas” enquanto o País caminha a passos largos para o precipício.

Contudo, Cavaco também co-participou na Crise em que vivemos; tem muita razão quando afirma que tinha de por a “casa” em ordem e que a culpa da actual Crise esteve no Governo que se seguiu (o de António Guterres).

Tem “muita razão”, mas não tem “toda a razão"; e não a tem porque Cavaco “olhou” essencialmente para a melhoria da eficiência do fortalecimento do papel do Estado na sociedade portuguesa e esqueceu-se do papel da cidadania – ora, a causa da actual situação do País é precisamente essa: o forte papel interventor do Estado na sociedade portuguesa e o correspondente esmagamento da capacidade de exercício da cidadania por parte dos cidadãos portugueses.

Cavaco deu o mote (que já o precedia); sob pressão da nossa cultura (da nossa praxis social), António Guterres seguiu em frente desabrido – em quanto terão aumentado os impostos nos últimos 15 anos? Quantos milhares de milhões de euros, dos nossos impostos, foram depredados em pseudo investimentos, em investimentos não rentáveis e em investimentos de rentabilidade duvidosa e a longuíssimo prazo? Quantos empregos fictícios foram criados? Quanta burocracia foi acrescentada à anterior (para bloquear ainda mais a iniciativa dos cidadãos)? Quanta displicência, oportunismo, deixa andar e falta de sentido de responsabilidade foi injectada nos serviços de saúde, de educação, judicial, administração, etc?

E foi isso que Cavaco se esqueceu, ao definir (num brilhante discurso) as grandes linhas (desafios) que nortearão a suas preocupações durante a sua Presidência.

Cavaco esqueceu-se de colocar entre as suas mediadas de intervenção, enquanto Presidente da República, a que eu considero que deveria ser a “primeira”, a fulcral à democracia portuguesa e ao desenvolvimento, a imprescindível como resposta à presente Crise: ou seja, a urgentíssima preocupação e necessidade em se promover a capacidade dos portugueses exercerem a CIDADANIA.

Pareceria do mais elementar: “deixar os cidadãos portugueses poderem agir”; mas não é – os políticos portugueses e o Estado não acreditam na cidadania, não acreditam na sociedade civil portuguesa. Portugal não é a Nação, é o Estado – por isso não somos de facto uma democracia(segunda a concepção anglo-saxónica; aí, aonde ela teve a sua origem).

A resolução da nossa Crise não passa só por dizer “deixem-me trabalhar”; passa, essencialmente, por dizer “deixem os portugueses trabalhar”.

Talvez tenha sido só esquecimento de Cavaco; talvez esteja também entre as suas preocupações a cidadania, embora não fizesse parte dos desafios que enunciou – esperemos que sim. Pelo menos, a integração de J.C. Espada no seu gabinete é a esperança de que um novo olhar sobre a Cidadania pode ter lugar, finalmente, em Portugal.